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Aqui não se fala dos conceitos de Lacan e a palavra lugar deve ser pensada em sua definição matemática

Pelo dia dos Mestres


Haroldo P. Barboza *

Um dia basta?

Basicamente cada categoria tem seu dia no calendário cívico. Policiais, motoristas, médicos e professores (entre outros tantos) são lembrados pela sua importante participação na cadeia produtiva deste país. O “seu dia” deveria ser motivo de festa e alegria. No entanto, serve para lembrar com tristeza os demais 364 dias do quanto são relegados e humilhados por normas que não reconhecem os valores que agregam à sociedade. No dia do Professor, cabe-nos uma breve meditação sobre as penúrias que nossa classe desfruta.

Prezados Mestres do Brasil!

Temos plena consciência de que esta laboriosa classe exerce preponderante papel dentro de nossa sociedade. E esta, neste momento da história, encontra-se perigosamente adoentada e sem um remédio imediato para recuperação de sua dignidade esgarçada por sucessivas “normas” educacionais que a cada governo reduz sua importância (e salário) enquanto aumenta a liberdade (falta de respeito) dos alunos.

Atravessamos um período conturbado onde todas as áreas sociais (em todas as esferas) encontram-se abandonadas pelas autoridades e trazendo enormes transtornos a todos nós. Torna-se desnecessário ilustrar cada carência que compromete nossa qualidade de vida cotidiana dentro de nosso imenso e maltratado território. Certamente vocês se defrontam com várias delas ao longo do dia. É angustiante, desgastante, intrigante e revoltante.

Especificamente aqui, temos consciência das dificuldades que vocês (meus colegas) enfrentam (até mesmo na área privada) para desenvolver um trabalho pleno para atender nossos herdeiros: falta de material (inclusive higiênico), ambientes sem manutenção correta (quedas de quadros, cadeiras, janelas, reboco), salários indignos (congelados, ao contrário das tarifas), desrespeito dos alunos (protegidos por estranhos estatutos), diretrizes confusas e em muitas vezes, falta de apoio gerencial superior. Estamos perdendo o espaço de formadores de opinião para a boa formação do jovem cidadão que troca suas palavras (assim como a dos líderes religiosos) pelo ruído das armas que angustiam nossas famílias.

Situação desconfortável que vocês (principalmente mulheres ainda discriminadas pelo sistema machista mundial) enfrentam com bravura por mais de 20 anos. Coragem que nasce do amor que possuem pela digna profissão e pelo recebimento de carinho por algumas doces crianças. E ainda precisam aturar alguns pais distantes que só comparecem ao colégio quando são chamados para explicar o mau comportamento dos filhos ocasionado por uma orientação familiar deficiente. Ou para reclamar de uma unha quebrada do filho que caiu da cadeira.

Temos a perfeita noção do quanto é difícil lutar para incutir algo de útil na mente de nossos herdeiros, numa época em que eles são massacrados pela mídia que invade nossos lares (tv e Internet) sem nenhum critério de respeito aos valores morais, familiares e religiosos. Até porque esta conduta não interessa aos vermes que se encastelaram no poder e lucram com o caos moral que nos envolve e que nossa inércia não tem forças para combater com a valentia necessária. Os (e as) chefes de família passam o dia correndo atrás do sustento e deixam seus filhos sem apoio familiar, sendo contaminados pelo cenário de sujeira, imoralidade e abandono que circundam as soleiras de nossas casas.

Nós e outras categorias já esgotamos nossas paciências com este quadro que oprime nossas famílias e que tende a se eternizar se não mudarmos nosso comportamento aparentemente acomodado nestes últimos anos. Não basta ficarmos indignados diante da mídia “amestrada” com as medidas editadas freqüentemente e que basicamente beneficiam os poderosos grupos que ditam as regras em nossa terra. Pela lucidez que temos a felicidade de possuir, precisamos esclarecer com convicção aos que se relacionam conosco diariamente. Precisamos nadar mesmo que em direção oposta das ondas maléficas.

Afinal de CONTAS, não somos nós que as pagamos? Então temos direito de definir nossas necessidades e anseios. Algo que líderes governamentais jamais nos permitiram realizar. Nossos atuais “representantes” públicos pisaram nas procurações que lhes concedemos através do voto. Suas fotos freqüentam as páginas policiais dos jornais.

Pelo fato de não fazermos parte de nenhum partido político nem de alguma entidade relacionada a qualquer um deles (muitos não honram suas próprias siglas), convidamos vocês para uma reflexão que nos possa fornecer uma luz dentro da treva cívica que nos envolve. Reúna seus pares e idealizem uma forma de combate que possa ser disseminada entre seus alunos para salvar esta terra que será deles em breve.

Nas eleições municipais podemos iniciar a urgente faxina dentro da “casa do povo” de cada município antes que a lama que brota dos palácios governamentais penetre em nossos lares em grande escala. Em doses homeopáticas ela já pinga através da falta de censura oficial e familiar que libera as telas de LCD sem nenhum critério.

Precisamos engajar nesta empreitada os jovens que nos cercam, pois em síntese, é para eles que ainda mantemos este país erguido (ainda que cambaleante). Quando mudarmos de plano existencial, desejamos que eles se lembrem de nós com orgulho, pelo legado positivo que deixaremos para eles.

Numa coisa estamos alinhados em pensamento: votar nos “mesmos” (e seus herdeiros) que poluem o cenário político desde o início da década de 80 certamente não vai amenizar nossos problemas. Quanto mais resolvê-los!

Temos a total certeza que a classe dos Professores carrega na alma o orgulho de ver SUA pátria crescendo e sabendo que sua atuação é a de maior peso nesta batalha onde a poderosa arma que derruba a ignorância brota de seu espírito valente: a palavra.

Nota 1: este texto foi enviado no início de março de 2008 a quase 20 entidades relacionadas com os docentes do país. Nenhuma resposta (contra ou a favor) foi devolvida. Silêncio total. Tudo está contaminado e anestesiado ou ainda existe um fio de esperança? O tal túnel já desabou inteiramente? E a luz que existia dentro dele ainda tremula no poço de vergonha que habitamos?

Nota 2: em linhas gerais, este “chamado” pode ser adaptado e enviado a outras categorias profissionais que igualmente estão sendo menosprezadas e desvalorizadas pelas políticas trabalhistas e sociais em voga em todas as esferas. Pelo menos para testar se estão “satisfeitas” com o atual cenário ou ainda possuem forças para lutar por sua dignidade, honrar sua tradição e passar um belo exemplo aos seus herdeiros.

* Haroldo P. Barboza - RJ/Vila Isabel
Matemática (infantil) / Informática (adulto)
Autor do livro: Brinque e cresça feliz.