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Aqui não se fala dos conceitos de Lacan e a palavra lugar deve ser pensada em sua definição matemática

O último feijão de coco - tempo de rir, tempo de chorar

Era Natal ou Ano Novo, não lembro bem, mas a menina, minha namoradinha, chorava. Indignação da minha parte, "eu estou aqui, meu bem"... Seu pensamento estava longe. A mãe dizia que eram recordações. Não seriam por certo do pai que ela não conhecia. Talvez fosse pela desagregação da família, achei o mais provável.

Numa hora de desabafo, muito antes desse dia, ela tinha me dito que não conhecia o pai, nem fazia questão de conhecer. De repente poderia até ser um cara que na rua estivesse lhe dando uma cantada. Que estranho... Ainda bem que não entrei para essa família, muita complicação.

Quantas vezes você chorou no carnaval? É provável que, vestido de Pierrot, tivesse lamentado a perda de uma Colombina. Felizmente quando isso acontece a perda é tão efêmera quanto os poucos dias de folia.

São João, Santo Antonio, São Pedro. Sua batata já assou enquanto o cumpadre Fulgêncio contava uma historinha para a Ritinha, aquela caipira por quem você nutria enorme simpatia? Tudo não passa no entanto de fatos corriqueiros, com ferimentos leves.

Eu queria falar da data atual, Sexta-feira Santa, Sábado de Aleluia, Páscoa. Não são datas alegres, nem mesmo o dia de malhar o Judas. O costume, nas grandes cidades, está completamente abandonado. Antigamente era uma tristeza aparecer no longo testamento do Judas. Ou você era corno, suas filhas, piranhas, seu filho, gay ou você era um amigo do alheio. O período que antecedia a malhação do traidor de Cristo muitas das vezes dava polícia, era só aborrecimento.

A Sexta-feira da Paixão sempre foi um dia em que apenas se comia peixe; carne era uma enorme heresia. O padre também contava suas historinhas. Aquela família tinha feito bife no dia santificado. Quando o homem cortou a carne esta começou a sangrar que não parava mais. Peraí, seu padre, o senhor quer que um menino de 10 anos, um menino com padrões morais já em desenvolvimento acredite nessa léria?

Minha família foi educada na crença católica. Nunca fui de quebrar paradigmas então, mesmo não acreditando muito, sempre segui os dogmas cristãos. Sexta-feira Santa era peixe e acabou-se.

Não lembro das comidas que a mãe fazia, mas o feijão com coco na Semana Santa era inesquecível, de se comer ajoelhado. Acompanhava um bacalhau no coco de primeiríssima. Muito me espanta que tanta gente não conheça esse maravilhoso prato do nordeste.

Neste ano não comi o feijão com coco. Não tinha quem fizesse. Procurei por restaurantes que servissem a iguaria mas só encontrei as receitas. Vou negociar com a mulher para que quebre a rotina. Providenciarei um bom vinho para a ocasião. E algumas lágrimas...

1 comments:

26 de abril de 2011 às 14:05 Pris Müller disse...

Fantástico! Adorei Luiz.

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