Lugar_RSI

AvatarLugar do Real, do Simbólico e do Imaginário
Aqui não se fala dos conceitos de Lacan e a palavra lugar deve ser pensada em sua definição matemática

O cemitério dos elefantes

Ou, o último e-mail

Criança ainda, eu via no cinema que o sonho de todo caçador era descobrir o cemitério dos elefantes, aquele lugar secreto para onde os animais se dirigiam ao pressentir o fim da existência. Entre os homens há comportamentos semelhantes. O doente se aparta do convívio social e se isola no sofrimento, muitas vezes como consequência da própria enfermidade.

Luz de Luma escreveu recentemente: "E se eu, ou outro blogueiro qualquer, morrer de uma hora pra outra, como todo mundo vai ficar sabendo? Será que vão ficar vindo aqui e olhando o mesmo post por duas, três ou mais semanas, até desconfiar que algo aconteceu?"

Nas minhas listas essas notícias são repassadas, quando não imediatamente, pelo menos anunciando a missa de 7o dia. É claro que a ninguém ocorre comunicar seu iminente passamento. Às vezes essa comunicação é silenciosa, o amigo faz uma visita, até sorri e dali a algumas semanas ficamos sabendo que ele se foi.

Darcy Ribeiro disse a uma profissional do Hospital Sarah Kubitschek, onde estava internado (com câncer): “Eu preciso desesperadamente dar uma aula, mas eu quero dar aula a uma criança, me arranja uma criança”. Ela lhe trouxe seu filho, de dez anos. Ele terminou a aula, tomou banho, barbeou-se, colocou perfume – porque era vaidoso –, deitou-se, entrou em coma e morreu poucas horas depois.

Há dois meses e meio recebi um e-mail contendo apenas três linhas em termos não muito usuais:
Lailo qual é o teu tel e o teu cel
um abração do amigo
grato pelo que aprendi com voce

Sabia que ele estava muito mal, depois um amigo comum me falou sobre o agravamento da doença. Foi a despedida. O último e-mail.
Comigo ninguém precisa ficar em estado de dúvida. Na undécima hora, quando eu for convidado para a Vinha do Senhor tenho dois poemas para deixar no blog: o soneto 71 de Shakespeare,

No longer mourn for me when I am dead
Then you shall hear the surly sullen bell
Give warning to the world that I am fled
From this vile world, with vilest worms to dwell:

Nay, if you read this line, remember not
The hand that writ it; for I love you so
That I in your sweet thoughts would be forgot
If thinking on me then should make you woe.

O, if, I say, you look upon this verse
When I perhaps compounded am with clay,
Do not so much as my poor name rehearse.
But let your love even with my life decay,

Lest the wise world should look into your moan
And mock you with me after I am gone.

Ou o poema Tithonus de Lord Alfred Tennyson,

The woods decay, the woods decay and fall,
The vapours weep their burthen to the ground,
Man comes and tills the field and lies beneath,
And after many a summer dies the swan.

. . . . . . . . . . . . . . . . . . .

O verso acima, e após muitos verões também o cisne morre, serviu de título a um livro do inglês Aldous Huxley, meio romance, meio ficção, Também o cisne morre, uma crítica ao desejo sempre alimentado pelo homem de viver eternamente.

12 comments:

16 de outubro de 2008 às 23:13 Anônimo disse...

Em qualquer das hipóteses, sintonizar é preciso.
Só dependemos de ajustar a freqüência.
Apenas me agrada a idéia de que eu “vá” primeiro do que os amigos.
Isso, claro, se estivéssemos falando de uma partida.
Se for somente sobre e-mail e sobre elefantes, tudo me diz que falta muito para os amigos partirem.

17 de outubro de 2008 às 07:55 Anônimo disse...

Luiz, me deu uma idéia: Vou programar um postezito para daqui um mês e sempre reprogramarei quando a data estiver chegando. Vai que eu morra e ninguém se lembre de avisar os amigos blogueiros?

Pensando superficialmente, a cada blogue fechado é uma morte de idéias que presenciamos.

Vê, existem mortes e mortes. A pior é morrer em vida! Bom fim de semana! Beijus

17 de outubro de 2008 às 14:25 Anônimo disse...

...e eu que já morri tantas e tantas vezes ...

umas de morte 'matada'
outras de morte 'suicidada'

...justo eu que quero viver pra sempre...

SaToShI

17 de outubro de 2008 às 17:29 Carlos Emerson Junior disse...

Lalo e Luma, mas vocês só pensam nisso ???? rsrsrs
Basta fazer quem nem conta-conjunta de banco, alguém com a senha do blog se encarrega de avisar.
Se bem que deixar o blog no ar, paradão, fica uma coisa meio misteriosa, né não ?
Ou mórbida...sei lá...
Um abração.

17 de outubro de 2008 às 22:55 Sonia Regly disse...

Amigo Lailoooooooo,
Coloquei uma interessante postagem sobre as loucas descobertas da ciência.Passe por lá, é sempre uma honra recebê-lo.Beijão

19 de outubro de 2008 às 14:30 Ricardo Rayol disse...

mórbido pra cacete... credo risos

19 de outubro de 2008 às 16:27 Nothingandall disse...

É verdade... Gostei! É pena não ser facultado que do «outro lado» ainda se tivesse a oportunidade de comunicar com este... uma espécie de transição para pôr os pontos nos, ou escrever o tal soneto último. Espero, porém, que ainda falte algum tempo :)

19 de outubro de 2008 às 21:54 Sonia Regly disse...

Lailo,
Legal esse post,gostei muito, vc sempre com boas e interessantes postagens. T~em post novo: Como turbinar o cérebro.Apareça por lá,deixe sua importante opinião.Abração.

19 de outubro de 2008 às 22:14 Blog da Mary disse...

Se o blog da Mary ficar sem atualizações por mais de 10 dias e, sem nenhum aviso de férias etc..., meu amigo, nestas alturas já estarei lá do outro lado...rsrsrs espero que isso demore pra acontecer.
obrigada pela visita.
Abraços e boa noite

21 de outubro de 2008 às 20:12 vandehugo disse...

Já estou desconfiando que esse post foi psicodigitado.

A minha proposta não merece crédito?

21 de outubro de 2008 às 20:12 vandehugo disse...

Ah sim, é essa:

http://vandehugo.com/2008/07/30/quando-eu-morrer/

22 de outubro de 2008 às 11:00 Anônimo disse...

A morte é um assunto de que, normalmente, fugimos, embora todos saibamos que ela é inevitável. Acho que, na úndécima hora, o que temos de ter é paz para chegar às vinhas do Senhor, para usar sua expressão.

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