Um instantâneo da infância
A água descia muito forte e me conduzia por entre a relva alta.
Meu corpo não flutuava, era arrastado.
E eu pensava que sabia nadar.
Chuva é a alegria de toda criança.
Naqueles tempos, raros eram os muros, raras eram as edificações.
Minhas modestas aventuras de menino bem comportado não tinham barreiras.
Viam-se as ruas do outro lado do quarteirão.
E fazíamos nossos próprios atalhos;
para ir para a escola;
para ir brincar com a garotada;
assim atravessávamos os terrenos baldios.
Minha casa nunca teve um jardim. Atenção, já mudei de cenário e de estilo literário. Estou morando agora a 300 metros do lugar onde se originou esta narrativa. Meu pai sonhava ter um sítio algum dia, um sonho não concretizado. Mas nosso terreno era um pequeno sítio e um quarto dele, 12 X 10 metros, era plantado com cana de açúcar. Outra área, de 15 X 10 metros produzia aípim. Sem contar os cinco abacateiros, o pé de carambola e um pé de feijão-guandu.
Ainda a chuva. Uma conhecida da minha mãe me havia prometido mudas de flores. Eu deveria ir buscá-las quando chovesse. Mas eu era muito guri. Esse projeto de jardim não foi adiante.
Meu pai era caminhoneiro. As condições da estrada Rio-Bahia eram péssimas. As viagens duravam dez, quinze dias, pelo menos. Quando ele voltava sempre havia más notícias - sobre o custo de vida. Minha mãe desfiava o rol da carestia e eu ficava deprimido. E arquitetava a organização de uma grande horta para prover o sustento da família. Mas no dia seguinte eu já estava jogando bola de gude com a molecada.
Acredito até que um pouco adiante eu tenha derrubado alguns moínhos de vento. Mas não foi no tempo em que eu nem sabia nadar.
1 comments:
Adorei seu texto!
Muito bom!
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