Naquela manhã a rua estava agitada. O gás que se desprendia do lixo acumulado durante muito tempo em um poço prendeu lá embaixo dois homens que estavam fazendo uma limpeza. Quando chegou a água canalizada nas casas da minha cidade a maioria das pessoas aterrou os poços com o lixo doméstico. Quando a água faltou, por descaso das autoridades, certamente, alguns quiseram recuperar seu primitivo fornecimento. Lá na minha rua deu em tragédia. Vieram os jornais, as emissoras de rádio, a polícia, só os bombeiros é que se demoraram, infelizmente. Quando retiraram os dois trabalhadores eu julguei que estivessem mortos. O gás estava muito forte. Um deles sobreviveu.
Estive perto todo o tempo e presenciei as tentativas feitas para tentar salvar aqueles dois e até a intenção de um vizinho de descer. Já estava de calção e devidamente amarrado de cordas quando chegaram os bombeiros, que até fizeram grandes elogios à sua bravura e desprendimento.
O depoimento de um menino de doze anos - eu, no entanto, não interessaria a repórteres ávidos por transmitir a seus leitores toda a verdade do acontecimento. Devem ter recolhido informações até de pessoas que estavam de passagem por curiosidade, que não eram do local.
No dia seguinte li os jornais. Era uma outra história, parecida, é bem verdade, mas com omissões, exageros e acréscimos, sem contar as análises e interpretações feitas por todo bom jornalista. E também pelos maus.
A História contém omissões, exageros, acréscimos, interpretações e muitas dúvidas, pontos controversos que ficaram no terreno das conjecturas. No caso de Renan Calheiros a ocorrência maior é de omissões segundo ele mesmo, pois sua família não podia ficar sabendo de determinados fatos. Essa é a justificativa dele. Como aprendi na vida militar: explica mas não justifica.
Surgiu uma grande demonização da imprensa no caso desse senhor por parte de seus amigos, lógico. A imprensa tem esse elo fraco: algumas vezes distorce os fatos em prejuízo apenas dos fatos, outras vezes em prejuízo de pessoas ou de instituições. Existem campanhas fundamentadas em documentos, sem esquecer que documentos também estão sujeitos a análises, campanhas por interesse de corpo e campanhas pessoais.
Por considerar que estava sendo perseguido sistemàticamente por David Nasser é que Brizola apelou para métodos menos convencionais nesses casos: deu-lhe uns tabefes ao encontrá-lo em um aeroporto. Também Zuenir Ventura não gostou quando Hélio Fernandes comentou: "tanta gente boa morrendo e calhordas como o Roberto Marinho, Adolpho Bloch e Zuenir Ventura estavam vivos". Na primeira oportunidade, quando Fernandes fazia cooper na Lagoa, Zuenir lhe entornou uma lata de tinta marrom na cabeça. Hélio Fernandes foi socorrido por populares.
Até hoje me lembro das garrafais de Hélio Fernandes em relação a Brizola quando este era governador do Rio de Janeiro: "CORRUPTO E CORRUPTOR". Tempos depois, quando Brizola saiu candidato a presidente, na opinião de Hélio Fernandes o gaúcho era o mais capacitado de todos para a função. E também criticava a iniciativa de Brizola de ter editado o semanário "O Nacional" para a campanha quando mais proveitoso seria financiar a Tribuna da Imprensa que teria muito mais condições de lhe dar apoio. Eis o ponto.
Apesar de tudo não se deve apelar para a violência, para latas de tinta ou para a demonização. Que não se amordace a imprensa. Que se divulgue o que deve ser divulgado. Depois, que cada um arque com suas responsabilidades, inclusive a imprensa.
Brizola foi citado aqui por dois motivos: foi a maior vítima da imprensa (leia-se: Roberto Marinho). Nem um décimo do que lhe cobrou a imprensa foi exigido dos outros políticos e governantes. A acusação leviana que o apontava na primeira página do jornal, com grandes chamadas e fotos, era dado o desmentido na quarta página do segundo caderno.
Segundo motivo: ainda andam chutando o velho. Eu queria pelo menos saber quem são os heróis dessa gente. Aí a gente poderia começar a conversar. E tentar tirar a verdade do fundo do poço.
Ainda um reparo: se alguém muda de opinião não quer dizer necessàriamente que esteja venalizando seu comportamento. Por exemplo: o assessor de imprensa do Lula, Ricardo Kotsho, disse que Zuenir Ventura foi o único repórter que cobriu efetivamente a campanha do PT, sem idéias pré-concebidas. Zuenir disse que "caíu na cobertura como um foca que vai descobrir como é esse partido, quem é esse torneiro mecânico que quer ser presidente da república".
E lhe perguntaram: - E o que você encontrou?
Zuenir: - Uma grande abertura, tive acesso até às contas da campanha, ao extrato de conta de banco. E vi que estava lidando com gente íntegra, honesta, por isso tive a mesma relação. Mas isso não é valor, é obrigação.
Sem comentários.
Tentarei estender o assunto em outro artigo.
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